In Fios da Meada - testemunhos para uma colecção imaterial A casa e o sonho“O Palácio foi desde sempre um lugar muito presente para mim. Eu vivia do outro lado da Azinhaga e diariamente passava por aqui no percurso para a escola” - relembra Milu, nome pelo qual é habitualmente tratada. A relação de mera vizinhança entre a família Seixas e a família Piano estreitou-se após o falecimento do pai de Milu. À entrada do átrio à esquerda era uma sala de lazer – de dia ouvia-se música e bordavam-se os enxovais, à noite jogava-se à canastra. Seguia-se a habitação dos caseiros, e ao fundo chegou a ser a leitaria, que mais tarde passou para a zona agrícola, hoje Academia de Música. No Verão, após o almoço, desfrutava-se da frescura do Pátio do Chá, junto à grande murta. À hora do lanche aproximavam-se dois empregados trazendo uma padiola – um grande tabuleiro retangular com dois varais paralelos e um sistema de suporte no chão. Abria-se a toalha e estava a mesa posta para o lanche, com as loiças e os talheres, os sumos e os bolos, a melancia e o melão. Após o lanche jogava-se ténis num campo para o efeito, na zona superior à murta. Pelas seis e meia a Emissora Nacional passava o programa “Música para Dançar”, o convite ideal para a juventude subir ao Ringue de Patinagem e improvisar um baile. Os pares estavam formados e havia aqueles que, discretamente, se afastavam para um passeio na Alameda ou para o Pátio da Estufa, onde as orquídeas e os inúmeros pássaros nas gaiolas do pátio apelavam à poesia. Entretanto, na cozinha, já se iniciara o bulício dos preparativos para o jantar que, de Verão, se fazia na taberna, mais tarde apelidada por Casa do Plátano. Quando o tempo arrefecia as refeições passavam a ser na sala de jantar. “Toda a casa era habitada e vivida. A família não se fechava nela com as suas coisas, pelo contrário, abriam-na aos amigos e em parte também à vizinhança e ao povo.” Quando de festas grandes se tratava, como o casamento de um filho, a casa fervilhava. Da cozinha saía a água quente para os banhos. Junto à azenha estavam os fogareiros acesos para fazer as brasas para os ferros de engomar e na casinha ao lado duas ou três senhoras passavam a roupa. A decoração da casa era cuidada e os enormes lustres dos salões abrilhantavam o espaço.
Com a chegada do Outono a família Piano fazia as malas e viajava para a casa de Cascais, ficando o Solar ao cuidado dos caseiros. Durante o período da guerra, António Piano deixava-lhes a incumbência de fazerem uma panela de sopa para dar a quem mais precisasse. Pessoas sós, viúvas com filhos, famílias numerosas acercavam-se com a sua panela e a caseira servia-os do panelão. Na ausência dos Piano a Sobreda voltava a transformar-se, a silenciar, a sossegar, como se de uma ténue hibernação se tratasse. Fotografias cedidas por Maria de Lurdes Seixas
Julho | Charneca da Caparica/Sobreda - em retropectivaO projecto POP-pular foi apoiado pelo Programa Almada Juventude 2017, da Câmara Municipal de Almada, e apresentado na Casa da Juventude Ponto de Encontro, em Setembro 2017.
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Outubro 2018
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